quarta-feira, 18 de novembro de 2015

APRESENTAÇÃO

O livro Arte & Moda nasceu encomendado. Quem o encomendou foi o Senac-Rio de Janeiro, que posteriormente  me liberou para tornar a pesquisa acessível a todos que tenham interesse em ler sobre o assunto. Daí  o nascimento deste livro-blog, que vem a ser o segundo que realizo. O primeiro foi o “Nasci Gay” que traz o depoimento de cinco históricos profissionais da moda nacional.

E faço minhas as palavras de três imortais estilistas franceses: “A moda caduca, mas o estilo fica”, afirmou Gabrielle Coco Chanel; “Nunca se deve confundir moda com esnobismo, disse Yves Saint Laurent. E Pierre Cardin declarou: “a moda é para todos e não só para uma elite.”
Em Arte & Moda há uma reflexão sobre o que é arte, o que afinal chamamos de arte, o que mantém os nossos olhos abertos e nos traz inspiração e prazer e alegria de viver, de estar vivo. Logo a seguir vem um breve histórico sobre a pintura, sobre a arte do vestir, apesar das pessoas atualmente considerarem o vestir um simples ato do cotidiano, feito passar água no rosto, escovar os dentes, escovar os cabelos ...!   Espero que gostem da leitura.


Ruth Joffily é jornalista, escritora e professora de moda. É autora do filme documentário “História da Moda no Brasil”, que tem produção de Candido José Mendes de Almeida. Última apresentação na TV Cultura (São Paulo), em 2007. É autora também dos seguintes livros:  “Marilia Valls: um trabalho sobre moda”,editora Salamandra, 1989 (esgotado); “Jornalismo e Produção de moda”, editora Nova Fronteira,  1991 (esgotado); “Vista-se como você é”, editora L&PM. 1997 (esgotado); “O Brasil tem estilo?”, editora Senac, 2000 (esgotado); “Produção de moda”, co-autoria, editora Senac, 2011; foi editora do livro-brinde “História da Camiseta”,vários autores, patrocinado pela Hering e que jamais foi comercializado. Autora do livro-blog “Nasci Gay”  que se encontra no seguinte endereço virtual: nascigay.blogspot.com.br . Tem um blog com artigos diversos: www.vistasecomovocee.com.br . E colaborou com diversas publicações e livros: escreveu um capítulo do livro “Nas fronteiras do Contemporâneo: território, identidade, arte – Editora Maud, 2001; escreveu dois capítulos do livro “Sapatos, crônica de uma sedução – 1990-2008, coordenação de Perla Nahum onde há uma justa homenagem ao jornalista  Fernando de Barros (in memoriam). Trata-se de uma edição comemorativa dos 40 anos da Francal (SP).Realizou a pesquisa e a redação do livro “Anjos e Suspiros”, biografia de Luciola Villela. Criou e realizou, em 2009 a exposição “As dez calcinhas que abalaram o mundo”,em parceria com o artista plástico Robson Granado.

Ruth Joffily é professora de jornalismo e produção de moda, de história da moda, de pesquisa de moda e de jornalismo feminino. “Jornalismo de moda, jornalismo feminino e a obra de Alceu Penna” é a sua monografia de mestrado, realizado em 2002, na faculdade de comunicação da UFRJ.  “Arte e moda” é o seu segundo livro-blog em parceria com o designer Antonio Kvalo.
Ruth faz free-lancers de textos e faz pesquisas para livros de terceiros e ministra aulas, inclusive particulares e  realiza pesquisas para dissertações e monografias sobre moda. E-mail: rj.joffily@gmail.com ; celular (21) 996-177764

domingo, 1 de novembro de 2015

O que é Arte?


Uma tentativa de definição

"Arte é cada vez mais necessária, ainda mais no mundo massificado e massacrante em que vivemos hoje, onde pouco espaço reta ao ser para respirar. Não houvesse arte, não suportaríamos. O excesso de materialismo, intolerância, violência, a 'infraternidade' é o oposto da arte. Arte é exatamente o contrário: une, melhora quem faz e quem aborve, melhora os seres e aprimora o mundo" Olga Savary - escritora, jornalista e tradutora.

Definir arte é uma tarefa árdua, pois significa cair num terreno de areia movediça. Ou seja, há milhares de estudos sobre arte e cada um traz uma definição, uma explicação, e nenhuma delas é completa. Por isso, ao invés de buscar uma definição é melhor procurar entendê-la, através de seus elementos mais característicos.
Em nossa época as artes são vistas, sobretudo, como uma área privilegiada do fazer humano que permite ao indivíduo uma liberdade de ação emocional e intelectual inexistente nos outros campos de atividade humana, por isso unicamente o trabalho artístico é qualificado de criativo. Mas essa visão é muito relativa, uma vez que uma boa arte é um dom, uma habilidade desenvolvida em duro exercício de paciência.
Enxergar a arte como “um duro exercício” é um dado importantíssimo, pois como diz a sabedoria popular, “criar é 90% de transpiração e 10% de talento.” Ou seja, nada de pensar que um artista, um criador, já nasce pronto. Sem dúvida, o dom e o talento de “mexer” com a sensibilidade humana é uma coisa que a pessoa tem e que ninguém sabe explicar. Mas esse talento necessita ser “burilado”, o artista precisa encontrar uma linguagem que expresse seu dom, sua sensibilidade, e isso exige um longo trabalho.
Pessoas sensíveis não se envergonham em expressar ou deixar transparecer a emoção que sentem, quando deparam com uma obra de arte que os toca, que os faz sentir alguma coisa. E essa obra que fala sem utilizar palavras – tanto pode ser uma escultura, uma cerâmia ou um quadro (estamos nos restringindo aqui às artes plásticas) pode ter sido criada por um artista com formação acadêmica ou por um artesão analfabeto, que nunca saiu do sertão. O que ocorre é que o verdadeiro artista imprime ao seu trabalho uma singularidade tão sua, que transforma um mero objeto em arte. A representação desse objeto, aparentemente banal, vem impregnada de sua concepção do que vem a ser esse objeto. Podemos ir, mais além, a arte que nos toca, e nos faz, momentaneamente, “escapulir” da rotina, do corre-corre diário, e que nos faz sonhar, pode ser absolutamente simples. Tão simples que pode nos levar a dizer: “puxa, por que não pensei em fazer algo assim?” Só que esta aparente  simplicidade não é espontânea. Ela é fruto de um intenso trabalho. A busca da simplicidade exige, às vezes, de um artista anos de pesquisa. É o dominino de uma linguagem, que propicia essa simplicidade.
Todo artista, todo criador necessita pesquisar muito as formas. Pois criar é formar. Criar é dar uma forma a algo novo. Leia-se como novo, aqui, novas propostas, novas coerências estabelecidas pela mente humana; fenômenos vistos ou relacionados de uma maneira inédita ou diferente. Então, a capacidade de criar inclui a de relacionar, ordenar, configurar e significar. Trocando em miúdos, o ser humano sempre foi um ser formador, um ser com conteúdo, capaz de relacionar os eventos, fatos ou fenômenos ocorridos em volta dele. Só que ao artista, ao criador cabe configurar os fatos dando a sua “versão”, a sua interpretação, o seu jeito de ver/enxergar o fato. Ele dá significado aos estímulos que recebe diariamente. E esses estímulos podem estar relacionados a fatos corriqueiros como, por exemplo, o jeito como as pessoas andam, as casas, as cores, sons, cheiros.

Todas as pessoas recebem, a cada instante, dezenas de estímulos. Mas só os artistas são capazes de fazer uma releitura desses mesmos estímulos, associando-os uns aos outros, ordenando-os. E essa ordenação dos estímulos sempre segue uma organização interna, do nosso interior. Constitui-se numa busca de significados. E esta busca de ordenação é que leva o ser humano a buscar novas formas e, consequentemente, a criar. Ou seja, o artista se comunica com os demais seres humanos através  das ordenações das formas oriundas , ora do seu cotidiano, ora de seu próprio inconsciente, revistas com lucidez e toques de imaginação. Isso acontece porque a arte é fruto de um processo intuitivo, como veremos, a seguir, ao refletir sobre a relação entre a arte e a intuição.

Arte & Intuição

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A intuição vem a ser o ato de perceber, discernir, o ato ou capacidade de pressentir. Todo artista tem um lado de oráculo: ele prevê, profetiza ou advinha aspirações, sonhos e desejos humanos. Um exemplo: quando criou as bijuterias, numa época em que as mulheres ainda só usavam jóias, Gabrielle Coco Chanel previu que a mulher da segunda metade do século XX iria valorizar sobretudo a praticidade. Antecipando-se, Chanel criou a bijuteria nos anos 30/40 e declarou: “o que vale é o efeito e não os quilates”. Outro exemplo: ao lançar o New Look (um estilo luxuoso, baseado em ricos tecidos, fartas e amplas saias) o estilista Christian Dior previu que seus contemporâneos ansiavam conviver com as formas sonhadoras, sobretudo porque a realidade era de racionamento, escassez e de pobreza numa Europa destruída pela Segunda Grande Guerra. E o New Look de Dior explodiu feito uma “bomba atômica” com seu estilo requintado, que exibia formas precisas e ultra femininas, num momento em que as mulheres haviam até se esquecido da sua feminilidade e trajavam pesados e sisudos conjuntos que mais pareciam uniformes militares. Dior, com o New Look , captou o inconsciente coletivo da época, e ajudou a reerguer a indústria têxtil francesa. Chanel, ao inventar a bijuteria, antecipou um estilo baseado na praticidade que só ficou consagrado após os anos 60 do século XX. Na história da moda há diversos exemplos de estilistas que são criadores e que usam e abusam de sua intuição para lançar novas formas. Ou seja, eles captam, através da contemplação, da observação, verdades diferentes daquelas que se atinge por meio da razão e do conhecimento analítico. O artista, o criador, caminha no sentido oposto ao famoso pragmatismo voltado à ação imediata, e que é praticado, atualmente,  pela maioria das pessoas.

Pragmático: voltado para a ação, para as aplicações práticas. O conhecimento é um instrumento a serviço da ação. O pragmatismo é uma doutrina criada por Charles Sanders Peirce (1839-1914), filósofo norte-americano.

Mas quem deseja fazer arte, criar, se comunicar com seus semelhantes através da forma, não pode ser pragmático e muito menos ocupar a cabeça com preconceitos. Uma professora de história da moda no Brasil, curso ministrado numa escola de moda do Rio de Janeiro, pediu aos seus alunos uma proposta de estilo de uma moda nacional, baseada na influência da arte africana e na Umbanda e no Candomblé, religiões trazidas para o Brasil pelos escravos. Uma aluna trouxe dois desenhos razoáveis e viáveis. Até aí, tudo bem. Mas no texto explicativo, que deveria acompanhar o trabalho ela afirmou: “Destaco que estas religiões são praticadas só pelos pobres (..)”.Posteriormente, a professora  perguntou à aluna “ de onde havia tirado esse preconceito, que lhe soou como um aviso de segregação social. Será que ela ignorava os inúmeros artistas, estudiosos e políticos nacionais adeptos dessas religiões? E citou alguns dos mais conhecidos: Caetano Veloso, Gilberto Gil (ex-ministro da cultura), Carlinhos Brown, fora os já falecidos Carybé, Jorge Amado, Zélia Gatai e o ex-governador e ex-senador Antonio Carlos Magalhães. E a aluna refletiu ... E aprendeu uma lição importante: um estilista  que deseja criar, que deseja fazer arte – leia-se que deseja interpretar novos caminhos  da forma – jamais deve ser escravo de idéias preconcebidas e nem pode se fechar num mundo elitista. Para “tocar” as pessoas, para se comunicar com os seus semelhantes, o verdadeiro artista, às vezes, utiliza a intuição, não só para “acessar” seu próprio inconsciente individual, mas também o inconsciente coletivo da espécie humana, povoado por figuras míticas, símbolos e formas, e que é motivo de estudos na psicanálise.

Eliminando os preconceitos




Muitos artistas têm a sorte de captar, feito bruxos, o que as pessoas anseiam exatamente nesse momento. Outros, porém, andam a frente do seu tempo e profetizam estilos que apenas serão consagrados no futuro (próximo ou longínguo). Posso exemplificar com duas mulheres brasileiras, dois “oráculos” não compreendidos na época em que viveram. A primeira foi Pagu, pseudônimo de Patricia Galvão, jornalista, escritora, participante da Semana de Arte Moderna de 1922, em São Paulo, cidade onde vivia e gostava de freqüentar bares usando calças compridas, fumando e com cabelos curtos à La garçonne. Conclusão: escandalizou a capital paulista, foi marginalizada, mal vista, etc. Atualmente, seus gestos, atitudes e comportamento viraram um lugar absolutamente comum. A segunda brasileira a destacar é Leila Diniz, que gerou um verdadeiro escândalo ao aparecer grávida de biquíni, numa época em que a gravidez, no Brasil, era vista ainda como uma doença. Hoje, todas as grávidas expõem sua barriga em público. Todas são um pouco Leila Diniz.


No campo das artes plásticas, vale lembrar que Vicent Van Gogh, célebre pintor expressionista, não conseguiu vender seus quadros enquanto viveu. E vivia em absoluta miséria, dependendo de favores de terceiros e da ajuda do seu irmão Théo. Morreu aos 37 anos, em 1890. Cento e vinte anos após a sua morte, seus quadros são “verdadeiras minas de ouro”. Ou seja, são vendidos por preços altíssimos e se transformaram num investimento certo para bilionários no mercado internacional. Ter um Van Gogh é ter milhões de dólares em caixa ..! E há muitos outros artistas que já passaram por esta situação (terrível) de serem incompreendidos no tempo em que viveram. E o que leva pessoas de um determinado tempo, de uma determinada época a se chocar com uma determinada proposta artística? Sem dúvida alguma é a cultura, já que o ser humano é fruto do ambiente em que vive.

Arte & Cultura



O comportamento de cada ser humano se molda pelos padrões culturais, históricos, do grupo em que ele, indivíduo, nasce e cresce.” Faya Ostrower – artista plástica e escritora


É a cultura que vai determinar o que é arte válida, o que é arte não aceita, o que é bonito, o que é feio, num determinado momento histórico. Mas já vimos que comportamentos e atitudes não aceitos num determinado período podem ser aclamados num outro, pois tudo depende das mudanças culturais, que vão acarretar mudança nas cabeças, nas atitudes e na capacidade de julgamento das pessoas.
Mas quem será que decide o que é ou não uma obra de arte? A nossa sociedade delega este papel de crítico, ao historiador de arte, ao perito, ao restaurador/conservador do museu, ao marchand, aos diretores dos museus. São eles que conferem o status de arte a um objeto.
A cultura também prevê locais onde a arte pode se manifestar, locais que dão o status de arte a um objeto: as galerias e museus permitem que um pintor ou escultor exponha seu trabalho criativo. O local “enobrece” um objeto. O pintor, o escultor e/ou artesão que expõe, por exemplo, aos domingos, na Feira da Praça General Osório (Ipanema, zona sul do Rio de Janeiro) está fazendo parte de um circuito alternativo. Não está integrado num circuito artístico oficial. Pois cabe às galerias e museus “traçar” uma linha divisória separando os objetos artísticos oficiais dos “não oficiais”. 
Aos críticos, filósofos, estudiosos das artes plásticas e marchands cabe nomear quais são as obras interessantes, que valem um investimento, e as que “não são interessantes”. Resumindo, há um aparato cultural que “elege” as melhores peças artísticas de um momento histórico. E, assim, é sempre criada uma hierarquia dos objetos artísticos. Ou seja, quais são as melhores obras e as piores; quais são os mais destacados, criativos e inovadores artistas. Esses julgamentos são feitos o tempo todo. Mas vale frisar que todo crítico utiliza seus critérios pessoais no julgamento. O que ele faz é dizer que – segundo seus critérios – tal obra é melhor ou mais harmoniosa, mais bem realizada ou mais rica que a outra. E ao julgar, o critico está utilizando a sua cultura, pois as noções de beleza, de feiura, de harmonia, de equilíbrio, ou seja, as noções estéticas, são subjetivas e dependem, inclusive, de uma afinidade entre a cultura do crítico e a cultura do artista. Obras polêmicas, obras vanguardistas, obras inéditas jamais conquistam um consenso. Mas este consenso da nossa indústria cultural também não é estável e nem eterno. Ele muda, ele evolui, assim como a cultura, no decorrer da história. Hoje, por exemplo, a sensibilidade do mundo ocidental e oriental está muito mais aberta para compreender a obra de Vicente Van Gogh. O juízo de hoje, como vimos, o consagra e vai até mais além: o torna um excelente investimento.
   
Cada época se interessa pela arte ou “enxerga” a arte de uma maneira diferente. A cultura inclui flutuações do gosto, flutuações no tempo. E a crítica ora exalta, ora desvaloriza ou “coloca no purgatório” uma obra de arte. A crítica é também inconstante, subjetiva, assim como os conceitos sobre o que é arte e os estudos sobre estética, que vem a ser, numa definição simplificada, uma filosofia que estuda as condições e os efeitos da criação artística. Em poucas palavras, cabe à estética fazer um estudo racional do belo, definindo, inclusive, o que é a beleza, o que é a feiura, o que tem harmonia, dentro de um determinado tempo histórico, e numa determinada cultura. A estética também estuda as emoções e sentimentos que uma obra de arte pode suscitar no ser humano. Vale destacar que a estética – nas suas tentativas de conceituar a beleza – lida muito com dados subjetivos, com sensações e emoções. Ou seja, não há bases científicas sobre as quais pode um crítico, um estudioso, amparar seus conceitos. O que existe é uma sensibilidade depurada, um olhar “treinado”, que confere a um número restrito de pessoas o direito de afirmar o que é ou não arte. E é esse olhar depurado que subdivide a arte em estilos. E cada estilo guarda características de uma época. Você provavelmente já ouviu alguém formular a seguinte pergunta: “ de que estilo é tal pintor?”. Enquanto o crítico, o historiador, o restaurador, o marchand gostam, na maioria das vezes, de “rotular”, de “classificar”, de adjetivar, colocando tal ou qual etiqueta na obra de arte, há muitos artistas que “fogem” dessas rotulações, com medo  de que elas limitem sua capacidade de criação. “Ele é impressionista? Ou será surrealista? É abstracionista?. O que será que ele é?”. A cultura, através de seus agentes oficiais (crítico, historiador, etc) anseia em rotular. E o rótulo, muitas vezes, pode empobrecer uma obra de arte. A arte é um produto que nos escapa, que tem um modo inesperado de se revelar. Para dominá-la, para tentar lhe impor limites, surgem as classificações, os estilos, as etiquetas, os rótulos. E nessa  classificação são privilegiados os criadores que, parecem, aos olhos dos críticos, dos historiadores, enfim que parecem aos olhos dos seus contemporâneos, como mais importantes, segundo critérios culturais daquele momento histórico.

No próximo capítulo você terá a oportunidade de ver em detalhes as características de cada um dos estilos e sua influência na moda.

Arte & Moda




Você acredita que o vestir pode ser uma arte? É bem capaz de você  considerar o vestir um simples ato cotidiano, feito passar água no rosto, escovar os dentes, escovar os cabelos ...! Mas se houvesse possibilidade de você se transportar para o século passado, ou melhor dizendo, para 100 anos atrás, sem dúvida iria constatar que o vestir era uma arte. E uma arte que encantava a todos os pintores. Havia um culto à indumentária, um culto à estética. Como bem afirmou o poeta Baudelaire, em meados do século XIX, “uma autêntica toilette vale um poema.” Havia arte na aparência, nos gestos e na roupa. O ato de compor um estilo exigia noções de harmonia e unidade, elementos também presentes na composição de um quadro. A moda era vista como uma arte aplicada, porque compunha um todo que representava harmonia nas cores, harmonia nas formas e harmonia nos gestos e movimentos. Havia um refinamento na forma e no estilo e uma busca consciente de uma linguagem das roupas. Era como se a roupa tivesse alma ... Daí tantos pintores célebres terem se aplicado em reproduzir as roupas de séculos passados. Em cada retrato que criavam eles se mantinham fiéis ao estilo de vestir difundido num determinado tempo histórico. Fascinados pela arte do bem vestir, eles eternizaram estilos.
Pintor célebre Edgar Degas foi um pouco “costureiro” ao imortalizar o ritual de vestir feminino em três quadros. O primeiro se chama “Chez La modiste” (numa tradução literal, na modista), foi pintado em 1882, se encontra no Metropolitan Museum Of Art, Nova York – EUA – e retrata uma mulher no momento em que prova um vestido submetendo-se ao ritual de ajustes de modelagem, mostrando a costureira realizando os devidos acertos no corte, adaptando-o ao corpo da sua cliente. O segundo, batizado de “Chez La couturière” (traduzindo, na costureira) foi pintado por volta de 1882-1883, e também se encontra no Metropolitan Museum of Art, Nova York, USA – e retrata o ritual da escolha de uma toilette. No terceiro quadro, “Madame Jeantaud devant um miroir” (numa tradução literal, madame Jeantaud na frente do espelho) que se encontra no Museu d’Orsay, Paris – França, o pintor Edgar Degas imortalizou uma jovem senhora no momento em que ela admira o resultado final de sua toilette, ou seja, do seu traje. E  a moda do século XIX era uma arquitetura que dissimulava e modificava os corpos femininos, caracterizando-se pela acumulação de ornamentos e de complementos. Cabia à uma mulher elegante jamais sair de casa sem chapéu e luvas. Cabia à revista de moda, todas editadas em Paris (França), divulgar os últimos lançamentos.
No século XIX já existia, na França, uma forte imprensa de moda feminina. Fazem parte da história mundial da imprensa feminina as seguintes publicações: “La revue illustrée, L’art de la mode, La vie parisienne, Le petit courrier, Le journal des jeunes filles, La revue de la mode, La dernière mode, Le moniteur de la mode, Le magasin des demoiselles, la mode illustrée.”


E muitos pintores trabalhavam como ilustradores para estas revistas, sem assinar as ilustrações que hoje são vistas como autênticas obras de arte. O avanço da roupa industrializada, o “nascimento” da profissão de estilista, aquele que assina as suas criações, o surgimento da fotografia e do desenvolvimento, a partir do século XX, da arte abstrata: sem dúvida estas são razões que levaram o artista plástico a deixar de “retratar” a moda, que aliás caminhou, durante todas as décadas do século XX, para uma simplificação das formas, que teve seu auge no movimento minimalista.

Arte abstrata é aquela cujas formas e cores não possuem relação direta com formas e cores da realidade visual. No abstracionismo o artista se revolta contra a precisão da vida moderna, o racionalismo e a civilização.

Minimalismo ou, em inglês, "Minimal Art": surgida no final dos anos 60 fez com que a forma, a cor, composição e emoção fossem descartados do objeto artístico, reduzindo-o a uma estrutura simples, primária.

No passado, as roupas costumavam ser um meio direto de manifestar o status social. Hoje, ocorre uma certa inversão. Pessoas com dinheiro e poder procuram vestir-se e comportar-se de maneira simples. Ou seja, muitos não desejam "dar na vista".
Para valorizar suas criações , hoje são os estilistas, os criadores de moda que utilizam a arte como fonte de inspiração. Nos próximos capítulos vamos ver os principais movimentos artísticos, incluindo o surgimento do impressionismo.


Renascimento



Renascimento, Renascença: ato ou efeito de renascer, vida nova. Fim da Idade Média, início dos tempos modernos. Idade de ouro das letras e das artes. Movimento artístico e científico dos séculos XV e XVI, que perdurou de 1400 a 1560. Periodo de grande desenvolvimento comercial e urbano.
Renascimento é um período marcado por musas, mulheres inspiradoras, que traduziam uma beleza serena, suave e lânguida. Para Sandro Botticelli a graça e a harmonia estão nas deusas da antiguidade grega. Na tela, “Marte e Vênus” (que se encontra na National Gallery, em Londres, Inglaterra) há a glorificação do humano, do pagão,do natural, em oposição ao divino, ao extra-terreno, típico da Idade Média.
A Vênus de Sandro Botticelli representa a beleza, essa beleza que buscavam os artistas e humanistas da Renascença. E há, em todo o quadro, um grande apelo à vida, à mitologia grega, à antiguidade e à beleza feminina. O nu casto é enaltecido, assim como o belo traje branco, vestido por Vênus,que não corresponde à moda da época, pois é inspirado na antiguidade grega e romana. Já os cabelos de Vênus estão penteados segundo a moda das jovens de Florença, que adoravam usar apliques trançados. Esse quadro, uma verdadeira alegoria mitológica, foi criado em 1483.
Mas a musa maior do período renascentista é, sem dúvida, a italiana Lisa Gherardini, que se tornou um símbolo da beleza e da feminilidade ao ser retratada por Leonardo da Vinci. O quadro “A Gioconda” – que vem a ser o sobrenome do marido de Lisa, Francesco Del Giocondo, no feminino – foi pintado por Leonardo da Vinci, o mestre do renascimento, entre 1503-1505, e ficou conhecido como “Monna Lisa”.
Monna em italiano arcaico significa Madonna, ou seja, senhora. Pode-se, então, dizer que Monna Lisa é sinônimo de Senhora Lisa
As novas técnicas, todas elas descobertas nesse período, estão presentes nesse quadro de  Leonardo da Vinci, que se considerava um cientista. Ele imaginou máquinas volantes, estudou mecânica, geologia, ótica, hidráulica e muitas outras ciências, além de ter escrito um tratado sobre anatomia em que registra suas descobertas. Leonardo era um estudioso incansável, sempre em busca do novo. Na pintura, ele desenvolveu a técnica de esfumaçamento (sfumato, em italiano) em que procura “banhar” todo o quadro com uma neblina suave e evocativa, dando-lhe um “ar” de mistério. A técnica do “sfumato” e a técnica de diluir as distâncias, o que proporciona um sentido excepcional de profundidade, estão presentes no quadro Gioconda/Monna Lisa, onde há, também, um jogo de cores claras versus escuras e de cores quentes versus cores luminosas, muito sensual. Leonardo foi a maior figura da Escola Florentina, que surgiu na cidade de Florença, e marcou o período áureo da Renascença.
Mas será que Leonardo da Vinci previu o sucesso que faria a sua Monna Lisa, que está exposta no Museu do Louvre, em Paris (França), e nunca se cansa de ser enaltecida e até cantada por vozes imortais como a de Nat King Cole? Afinal, muitas pessoas ainda se lembram do refrão “Monna Lisa, Monna Lisa, Monna Lisa”, que ecoou em todo mundo quando Nat King Cole evocou a Gioconda nos anos 50 do século XX.
E apesar de ter quase cinco séculos de vida, ainda é o quadro mais copiado do mundo e ser tornou um modelo de mulher, que serviu de referência a várias gerações de artistas. Nos primeiros anos do século XXI foi publicado um anúncio da Bom-Bril E do amaciante de roupas Mon Bijou onde o garoto propaganda da marca apareceu vestido igual a Gioconda ou Monna Lisa.
Além do sorriso, tido como enigmático, que virou uma marca de sensualidade, um outro aspecto  que merece leitura é a roupa, os trajes de Monna Lisa. A Itália da Renscença cultuou o luxo. E o estilo italiano de vestir dominou, assim como as suas artes plásticas, em toda a Europa. A silhueta feminina desejada era cheinha, avantajada, se observada com os olhos da atualidade. Os tecidos e as formas eram pesados. Florença, Veneza e Milão possuíam uma excelente indústria têxtil. A moda era condicionada pela suntuosidade dos tecidos, que tornavam os movimentos  mais lentos, embora marcados pela harmonia, palavra de uso corrente numa época em que os artistas estavam, sempre, em busca da perfeição. No quadro Monna Lisa pode-se ver, a olhos nus, que ela ostenta um tecido numa cor neutra/escura e pesado, numa simplicidade temperada com sofisticação, destacada pelo bordado na altura do busto. Os decotes arredondados pediam cinturas altas, conforme a tradição grega e romana, que predominou no período renascentista. As longas mangas (que podiam ser detalhadas por drapeados e recortes) eram as mais usadas.


Os chapéus, muito usados na Idade Média, são substituídos, na renascença, por penteados entremeados por pérolas ou realçados por diademas encrustados de pedras preciosas. Mas no quadro de Leonardo da Vinci, a Lisa Gherardini ou a Monna Lisa está com os cabelos lisos, soltos. Por cima dos cabelos há um véu transparente que destaca, ainda mais, o clima de mistério presente nessa obra prima mundial.

Barroco



Barroco: produção artística que nasceu na Itália, no final do século XVI. Depois, conquistou todos os países europeus, tendo sido transplantado para a América do Sul pelos espanhóis e portugueses, seus colonizadores. Como estilo perdurou até a metade do século XVIII.
A palavra barroco origina-se do vocábulo espanhol “barrueco”, que designa um tipo de pérola irregular e de formação defeituosa. Como estilo artístico, o barroco caracteriza-se pela busca da emoção, e pelo uso, nas artes plásticas, da profundidade, volumes e cores. Toda pintura barroca traz um forte contraste de luz e sombra, além de sempre enfatizar caráter cenográfico e ilusionista. Ou seja, um tipo de representação que, pelo uso de perspectiva arquitetônica, tem paredes ou tetos que ampliam o espaço, dando a impressão de uma amplitude maior. E o recurso ilusionista é chamado pelos franceses de “trompe l”oeil”
Trompe l’oeil: engana o olhos, dá impressão de realidade. O verbo tromper, em francês, significa enganar - ou seja: "enganar o olho", numa tradução literal da expressão.

No quadro "Giusto Lipsio e seus discípulos, também conhecido pelo nome "Os quatros filósofos", pintado por Pedro Paulo Rubens entre 1611-1612 e que faz partye do acervo do Palácio Pitti, Florença (Itália), há toda uma riqueza de detalhes e variedades de cores barrocas. Dedicado à memória do irmão do pintor, Philip, falecido em 1611, e a Lipsio, o mestre italiano de ambos, a tela traz, ao fundo, o caráter ilusionista, alcançado através da perspectiva arquitetônica, com o uso, por exemplo, de cortina vermelha e pilastras.
Há também, um denso jogo de luzes, de claro versus escuro, numa pintura exuberante, que faz Rubens ser visto como o fundador do estilo barroco.
No estilo de vestir dos quatro homens presentes na tela, predomina a moda espanhola, que dominou a Europa da contra reforma, movimento que marcou a resposta da igreja católica às reformas promovidas pelo alemão Martinho Lutero.
Golas altas e largas,muitas eram plissadas;algumas eram lisas. Elas levantam as cabeças masculinas e dão a impressão de que a cabeça está separada do corpo. Até parece que foram feitas para colaborar com o caráter cenográfico e ilusionista da estilo barroco.
Fartos bigodes e barbas marcam os rostos dos quatro senhores. E as roupas são escuras, bem austeras. O toque de luz fica apenas por conta das golas brancas, bastante exuberantes.

Reforma: Martinho Lutero contesta a autoridade do papa, reconhece como única base da religião o texto da bíblia; recusa o culto aos santos e a utilização de suas imagens. Suas teses se propagam rapidamente pelo norte da Europa e são responsáveis pelo nascimento do protestantismo.

Contra-Reforma: a igreja Católica reage e faz o Concílio de Trento (1545-1563) que marca a sua renovação, reafirmando os dogmas nos quais todo católico necessita acreditar. A autoridade do papa também é reafirmada.


O estilo barroco se vincula não só à reforma e contra-reforma como também ao início dos governos absolutistas (sobretudo na França, Áustria e Alemanha) e à revolução comercial que trouxe, através das grandes navegações, a descoberta de novas terras. E nessas "novas terras" há ouro, pedras preciosas que passam a ser explorados, sobretudo por espanhóis e portugueses, que enviam seus tesouros para as cortes europeias. Daí o luxo dos vestidos das damas da corte, com suas saias longas, bordadas em ouro, pedras preciosas e pérolas.


Absolutismo: os reis são senhores absolutos com amplos poderes adquiridos por direito divino e que passam a exigir das artes sua glorificação pessoal. São glorificados pela escultura, pela pintura e pela arquitetura. O estilo barroco celebra a glória dos reis absolutistas.


No quadro “As meninas”, pintado em 1656 por Diego Rodriguez da Silva Y Velázquez, e que se encontra no museu do Prado, em Madrid (Espanha), foi imortalizada a moda espanhola feminina da contra-reforma, marcada também pela descoberta da América Latina/América do Sul. As  meninas do quadro de Velázquez são as damas de honra da corte espanhol. Elas, na tela, estão em torno da jovem infanta Marguerita, a filha do rei. O quadro retrata também o imortal pintor no momento em que faz,numa imensa tela bem iluminada e visível, o retrato do casal real.

No estilo de vestir das meninas reproduz o estilo adotado pelas suas mães, característico de uma época em que ainda não existia uma moda infantil. Elas, meninas, parecem umas anãzinhas em suas roupas austeras, de cores sóbrias/monótonas. O corpete é bem justo, cintura bem fina, mangas com detalhes. As saias tinham modelagem ampla nos quadris e eram marcadas por uma sobressaia rígida, feito uma crinolina, que provocava o volume “extra” nos quadris. Trata-se de um estilo severo e desconfortável, reflexo de uma época que não tolerava movimentos. O aspecto prático da roupa ocupava um lugar secundário  O que contava era o seu aspecto decorativo. E a vestimenta escondia/mascarava as formas femininas.


Crinolina: tecido feito de crina animal, bem resistente, próprio para forro. Anágua de crinolina, usada para armar e entufar a saia.


Um fosso separava, também, a moda da corte da moda do povo, adepto (tanto homens como mulheres) de um estilo mais prático,já que necessitavam se mexer, se movimentar, pois trabalhavam e muito. Já os nobres da corte cultuavam o ócio. Por isto suas roupas eram tão pouco práticas, tão desconfortáveis, sobretudo o estilo feminino. Vale ressaltar que a criança era vista, pela sociedade da época, como um “adulto imperfeito”. As roupas das meninas e dos meninos eram, literalmente, uma réplica da roupa das mulheres e homens. 

A roupa jovem, que tanto sucesso fez na sociedade contemporânea, surgiu com força total no século XX, um século que enalteceu, como nenhum outro, a juventude. No passado, aconteceu o oposto. Ou seja, os jovens imitavam o estilo dos seus pais, já que não tinham um estilo que pudessem chamar de seu. E é isto que se vê no quadro de Velázquez: meninas vestidas iguais às suas mães. Atualmente, o que se vê é exatamente o contrário. São as mães que se vestem iguais às filhas. Hoje é proibido envelhecer. Já na época barroca o que se via eram meninas vestidas como damas da corte.

Neoclássico



Neoclássico: surge no final do século XVIII. Restaura as artes da Antiguidade Greco-romana. Seus valores estéticos são valores morais. O belo ideal é o que une a beleza dos corpos à beleza do espírito. Este estilo procurou expressar os interesses e a mentalidade da burguesia da época da Revolução Francesa e do império napoleônico.


Importantes artistas do movimento neoclássico sonham em educar o público e desenvolver seu senso moral e cívico, e se inspiram na antiguidade Greco-romana para realizar, sobretudo grandes pinturas com motivos históricos, religiosos e mitológicos. Por outro lado, as telas que reproduzem cenas do cotidiano e os retratos dos burgueses consagrados, eram capazes de bem remunerar um artista. Menos solicitados eram os quadros com paisagens e natureza morta.

Jacques-Louis David foi um dos primeiros pintores neo-clássicos. Para ele, a beleza de Roma (capital da Itália) e seus monumentos antigos eram uma autêntica revelação. Em 1780, nove anos antes da revolução francesa, que ocorreu em 1789, David começou a fazer quadros com a história da antiguidade. E essas telas chamam a atenção pelas suas linhas fortes que guiam o olhar. Durante a revolução, Jacques-Louis David, politicamente engajado, colocou sua arte a serviço da França. E se torna, no poder, um observador privilegiado. Quando Napoleão Bonaparte conquistou o posto de Primeiro Consul, ofereceu a David sua proteção, nomeando-o primeiro pintor da corte.

A coroação de Napoleão está imortalizada num grande quadro de Jacques-Louis David chamado “A sagração do imperador Napoleão I”. A tela, pintada entre  1806-1807, mostra a coroação de Josèphine por seu marido, Napoleão Bonaparte, que admirava profundamente a antiguidade greco-romana e gostava de se imaginar um César ou um Alexandre moderno. Um dos seus emblemas era a águia imperial. No quadro de Jacques-Louis David é traduzida toda a pompa que envolvia a corte napoleônica e a figura de Bonaparte nos remete às imagens de César, na Roma antiga. A influência da Antiguidade também está presente na moda feminina, com suas cinturas altas,caimento lânguido, feito uma túnica.
Para Jean Auguste Dominique Ingrés coube imortalizar o homem de negócios, a burguesia triunfante, no retrato que fez, em 1832, de Louis-François Bertin, o fundador do jornal francês “Débats”. O quadro conhecido pelo nome de “M.Bertin” deixa bem à vista os trajes sóbrios do burguês bem-sucedido, que veste paletó e calças pretas, mais colete verde-musgo. O único toque de luz fica por conta da camisa branca. Na cintura, notem bem, já está o relógio, acessório que se consagra quando o burguês assume, também, o controle político, após a Revolução Francesa. O imortal poeta Baudelaire amava este quadro.
Para Baudelaire, a existência da tela “M.Bertin” era a prova do talento de Ingrés, “o único homem da França que realmente faz retratos.” E o consagrado pintor foi uma espécie de cronista visual da sociedade do seu tempo.
Outro retrato de Jean-Auguste-Dominique Ingrés é o de “Madame de Senonnes”, que se encontra no Museu de Belas Artes, em Nantes, França. O estilo de vestir da senhora Senonnes é fiel à moda da época da restauração, ocorrida entre 1815-1820, e que significa o retorno dos Bourbons (leia-se a família imperial francesa) ao poder, com a derrota de Napoleão. A cintura alta, que marcou a moda feminina durante o período de influência neoclássica, está presente no vestido de veludo em cor escura, com discretas transparências no colo, que deixam entrever parte do busto. Pescoço marcado por gola em renda, que também está presente nos punhos das mangas compridas. Nos dedos, vários anéis. Os cabelos negros estão presos e enfeitados apenas por uma tiara. Nesse período histórico, quem ditava as variações e mudanças da moda feminina era Paris (França), que já era vista como a capital da elegância, sobretudo do estilo urbano, das cidades, que se desenvolveu muito após a Revolução Francesa.

Vale destacar que Ingrés pintava ricaços e nobres só para pagar as contas no final do mês. Ele considerava o retrato um gênero menor da pintura e acreditava que a tarefa primordial da arte era produzir quadros históricos, com valores morais, conforme ditavam os preceitos neoclássicos.

E nos quadros que pintava para sobreviver, Jean-Louis-Dominique Ingrés era um detalhista, um perfeccionista ao reproduzir jóias, flores e panejamento dos tecidos, tão em voga naquela época.